quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Resposta a enquete de Cláudio Willer.




O que fazem os poetas? Como criam?

(enquete Cláudio Willer)

Pergunta complicada de se responder, assim, tenho que parar para pensar.

O poema surge de muitas formas, algo que me instigue, um desafio, uma frase ouvida de soslaio, um exercício proposto por amigos, uma conversa na Internet. Mas, via de regra, o poema vem em um insight, uma frase soa dentro de minha cabeça, algo como um sussurro, que deve ser imediatamente anotada, caso contrário vai embora do mesmo jeito que surgiu; por vezes acontece o encadeamento de versos assim que a frase é anotada, vão se desfiando palavras e mais palavras, anoto tudo da maneira como vem,  sem preocupação estética ou de correção ortográfica. Este material é devidamente guardado, em caderninhos, bilhetes enfiados nos bolsos, folhas soltas, esquecidos na mesa de trabalho.

Há poemas, raros,  em que nada deste processo é usado, alguns nasceram prontos, em geral hai-kais, e outros mesmo sem terem sido anotados, permaneceram  no grito original, nunca esquecidos.

Em um segundo momento este material é digitado, o que pode acontecer imediatamente depois da escrita, ou dias depois, ou meses depois. A primeira ação a ser realizada é a correção ortográfica e gramatical do texto, neste momento outras palavras e frases podem ser agregadas, ou apagadas seqüencias inteiras. Em outro momento, verifica-se o ritmo do texto, o uso de quebras dos períodos, a aglutinação em versos. Muitas vezes o primeiro texto desaparece sob as correções e alterações, surge um novo. Já aconteceu do material de sobra, assim por se dizer, gerar um novo poema. Outras vezes, dois poemas se aglutinarem em um só.

Isto pode se repetir muitas vezes, até que chega o momento de parar, em um determinado momento dá-se por pronto (ou não, o texto é meio que vivo e orgânico).
A forma final do poema se dá  a partir da leitura em voz alta. Como uma espécie de processo de afinação das palavras e sons. 

O terceiro momento é passar o poema para primeiros leitores, que ajudam a apontar incoerências e erros que porventura possam ter passado desapercebidos.



Edson Bueno de Camargo








segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Paternidade.







Sou meio danado com estas efemérides, tem tanto apelo comercial e mercadológico, que dá até raiva.

Esse negócio de pai é muito complicado, sempre tive uma relação conturbada com meu velho, e apesar de eu ser um puta fracassado e que não fiz nada do que ele quis ou planejou para mim, o velho tem um baita orgulho do filho poeta, que tem livro publicado, recebeu prêmios, todas estas coisas, apesar dele não fazer a menor ideia do que seja ou signifique bem isto. (Nem mesmo eu sei).

O certo é que quando temos os nossos próprios filhos, a coisa muda de figura, passamos a encarar a realidade de uma forma diferente, temos que crescer na marra, e a maturidade não vem com manual de instruções. Muitas vezes erramos na dose ou de disciplina ou de condescendência. Muitas vezes permanecemos em silêncio, quando uma palavra é esperada. Muitas vezes falamos, quanto o que se esperava era um ouvinte. E graças aos deuses todos que erramos, e sempre temos a possibilidade de reconsiderar, e recomeçar, e conversar.

Sou muito mais amigo de minha filha que deveria ser. Às vezes penso que deveria ter sido mais pai.

O certo que fui compreender a paternidade no dia em que nasceu meu neto, então caminhei na trilha da ancestralidade, e um arrepio na espinha me fez ter entendimento, como se passassem por mim todas as almas que carregamos desde o grande início em algum ponto do tempo.

Um neto faz resinificar ser pai, e para meu pai um bisneto foi um momento que significou sua existência, nunca ficamos tão próximos, nem mesmo na tragédia que um dia se abalou sobre nos.

A paternidade nos coloca definitivamente no ciclo da ancestralidade, passamos a ser responsáveis pela nossa linhagem que vem desde tempos idos e sem interrupção.

Diante da ancestralidade a morte não significa nada.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Falando de eleição e cultura.




Outro dia um camarada muito querido, dos tempos das boas lutas que hoje a mídia tenta desmerecer e desqualificar; respondeu a minha milionésima fala a respeito da ausência de Politicas Culturais em minha cidade, que as coisas não aconteciam porque pessoas como eu havia abandonado a vida pública e a ação política, porquanto não exigiam seu espaço, e permitiam que outros o ocupassem.

Em partes até concordo com este discurso.


Por outro lado, o que me fez desanimar da política, foi justamente esta lógica. Nos dias que se seguem, em plena campanha eleitoral, acontece uma batalha silenciosa e invisível, que nem todos se dão conta, em todos os grupos políticos, partidos, e tudo o que circula o poder. Grupos e pessoas, tentam por todos os meios lotear a possível vitória, arranjos são feitos no calor da campanha, promessas de cargos e empregos que nem sempre poderão ser cumpridas. Isto me dá um tremendo enfado.

Fazem parte do jogo estas manobras, são são injustas, muito menos ilegais, algumas resvalam na falta de ética, mas acabam por desqualificar qualquer possibilidade de uma ação concreta na solução dos problemas da cidade. A Cultura é a prima pobre, e diluída no meio de tantas "necessidades", some ou morre. Só é lembrada como espetáculo, nunca como formação ou reforçadora de ações populares, só é lembrada pelo viés populista.

Quando o assunto é Cultura então, entra para os assuntos periféricos e diluídos. A Cultura se dissolve entre os tantos problemas da cidade. Em geral, sobram para os cargos do setor de Cultura não os especialistas ou envolvidos na área, mas o primo maluco que o prefeito quer colocar longe do gabinete, ou o candidato a vereador que fez aquele acordão, em suma o rebotalho.
E por último, esta dinâmica perversa exclui as pessoas que realmente estão interessadas e que poderiam dar sua verdadeira contribuição, mesmo que em aspecto voluntário (embora isto é outro assunto disparatado que vale uma conversa), pois cai em um liame retorcido de realidade. Os órgãos já nascem com o vício das vaidades inflamadas e o somatório distorções de funções.
Vou votar em um dos candidatos, por um caráter republicano e cidadão, até já me decidi, mas sem a certeza que a Cultura será realmente contemplada.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Três perguntas a Marcelo Novaes - respostas revisadas e complementadas.



Entrevista:
 
 
 
Edson Bueno de Camargo: 1.Você acredita ainda ser possível a poesia em tempo de crise? Ou Adorno estava certo e não foi mais possível o poema depois de Auschwitz?

MN: Escrever poemas de Poliana, não. O pior do humano já veio à luz. Mas o poema pode atrair a atenção para o pior do humano para que nos cansemos dele, deste pior. Alguma mudança pode vir pelo cansaço ou pelo nojo. 

EBC: 2.Outro dia 
li que o mundo atual não permite às pessoas o exercício do humano, até que ponto você acredita ser isto verdadeiro, e até que ponto a arte e a poesia nos permitem este exercício do humano? 

MN: O humano inclui tudo, inclusive o pior do humano a que aludi acima. Os tempos de hoje me parecem como a abertura de um grande bueiro: a cara que estupra a garota na festa filma e põe no You Tube. Ficamos sabendo não só do crime, mas do exibicionismo do rapaz sádico. O pai da vítima e o pai do algoz não poderão desconhecer o fato. O pai do algoz não poderá alegar inocência de seu filho, a não ser fraudando os próprios olhos e consciência. O mesmo se aplica a agressão de gangues [futebolísticas ou pseudo-ideológicas], brigas escolares, pedofilia, o diabo a quatro. O artesanato do melhor do humano é trabalho voluntário, solitário, que se impõe e imprime [ou não] a cada indivíduo. Alguns artistas podem contribuir com sua fração infinitesimal para a evocação dessa vontade de construção do “exercício do bom e do melhor do humano” com seu trabalho de formiguinha. Muitos outros só espelharão os modos e valores de nosso tempo.

EBC: 3.Um conhecido escritor paranaense afirmou que para um autor sair da invisibilidade, basta só ser bom; que isto acontecia: acredita nisso? Ou existe muita gente boa por baixo do manto da invisibilidade?


MN: Este escritor parece "estar nos tirando".  [Cê tá me tirando , tiozinho!]. Parece crer em alguma equação bastante simplória entre mérito e reconhecimento, ou entre mérito e recompensa. Onde você encontra isso, na vida de todo dia: no serviço público? Na política? A meritocracia vige nesses âmbitos da vida? As instituições sociais premiam os mais talentosos? Bom, este fulano deve viver em outro mundo, onde Van Gogh pintaria quadros que seriam imediatamente aplaudidos, e não por ele mesmo, Van Gogh, crer no valor intrínseco de sua arte, mas também com o respaldo de outros que igualmente creriam na mesma.. Num mundo onde escritores como Augusto dos Anjos, Camilo Pessanha, Cesário Verde e mesmo Fernando Pessoa, teriam suas visibilidades, sim, mas não só post mortem. Livros reconhecidos em vida. Acredito, Édson, que, em nossa literatura do anonimato e cartas marcadas, do tapinha nas costas sem exposição corajosa do admirador que "prefere permanecer na coxia" [ou na cocheira] nunca ouviremos falar de muitos bons escritores, e que isso seja mais comum do que suspeita o simpático paranaense citado por você. Então, se você pensar numa visibilidade fora da linha do tempo da biografia do autor, além-de-seu-tempo-de-vida, pode ser que “algum dia o talento não passe em branco”. Mendelssohn redescobriu Bach, que era ignorado no tempo de Mendelssohn. Falei de música e pintura deliberadamente, porque isso pode se dar em qualquer arte. Os viéses de mercado, propaganda, divulgação da “persona literária” [o performer colocado à frente do escritor], apadrinhamentos, parentescos e que tais, tudo isso são viéses demasiado humanos que o paranaense pretende ignorar, fazendo tabula rasa da história, antropologia, psicologia de massas. O mérito e o reconhecimento podem ser unívoca e temporalmente co-associados em algum plano acima do nosso, mas não neste planeta. Talvez o paranaense esteja nos visitando de alhures. Um Uraniano em missão.


terça-feira, 26 de junho de 2012

Três perguntas para Marcelo Novaes





Entrevista:



Edson Bueno de Camargo:  Você acredita ainda ser possível a poesia em tempo de crise? Ou Adorno estava certo e não foi mais possível o poema depois de Auschwitz?


MN: Escrever poemas de Poliana, não. O pior do humano já veio à luz. Mas o poema pode atrair a atenção para o pior do humano para que nos cansemos dele, deste pior. Alguma mudança pode vir pelo cansaço ou pelo nojo. 


EBC Outro dia li que o mundo atual não permite às pessoas o exercício do humano, até que ponto você acredita ser isto verdadeiro, e até que ponto a arte e a poesia nos permitem este exercício do humano? 


MN: O humano inclui tudo, inclusive o pior do humano a que aludi acima. Os tempos de hoje me parecem como a abertura de um grande bueiro: a cara que estupra a garota na festa filma e põe no You Tube. Ficamos sabendo não só do crime, mas do exibicionismo do sádico. O pai da vítima e o pai do algoz não poderão desconhecer o fato. O pai do algoz não poderá alegar inocência de seu filho, a não ser fraudando os próprios olhos e consciências. O artesanato do melhor do humano é trabalho voluntário, solitário, que se impõe e imprime [ou não] a cada indivíduo. Alguns artistas podem contribuir com sua fração infinitesimal para a evocação dessa vontade de construção do “exercício do bom e do melhor do humano” com seu trabalho de formiguinha. Muitos outros só espelharão os modos e valores de nosso tempo.

 
EBC: Um conhecido escritor paranaense afirmou que para um autor sair da invisibilidade, basta só ser bom; que isto acontecia: acredita nisso? Ou existe muita gente boa por baixo do manto da invisibilidade?


MN: Este escritor parece crer em alguma equação bastante simplória entre mérito e reconhecimento, ou entre mérito e recompensa. Onde você encontra isso, na vida de todo dia: no serviço público? Na política? A meritocracia vige nesses âmbitos da vida? As instituições sociais premiam os mais talentosos? Bom, este fulano deve viver em outro mundo, onde Van Gogh pintaria quadros que seriam imediatamente aplaudidos, e não por ele mesmo, Van Gogh, crer no valor intrínseco de sua arte. Num mundo onde escritores como Augusto dos Anjos, Camilo Pessanha, Cesário Verde e mesmo Fernando Pessoa, teriam suas visibilidades, sim, mas port mortem. Acredito que nunca ouvimos falar de grandes escritores, e que isso seja mais comum do que suspeita o simpático paranaense citado por você. Então, se você pensar numa visibilidade fora da linha do tempo da biografia do autor, pode ser. Mendelssohn redescobriu Bach, que era ignorado no tempo de Mendelssohn. Falei de música e pintura deliberadamente, porque isso pode se dar em qualquer arte. Os vieses de mercado, propaganda, divulgação da “persona literária” [o performer colocado à  frente do escritor], apadrinhamentos, parentescos e que tais, tudo isso são viéses demasiado humanos que o paranaense pretende ignorar, fazendo tabula rasa da história, antropologia, psicologia de massas. O mérito e o reconhecimento podem ser unívoca e temporalmente co-associados em algum plano acima do nosso, mas não neste planeta. Talvez o paranaense esteja nos visitando de alhures.


sábado, 9 de junho de 2012

Concordo plenamente.

 

 http://carpinejar.blogspot.com.br/2012/04/todo-casado-por-muito-tempo-e-tarado.html

 

TODO CASADO POR MUITO TEMPO É TARADO 

 

Fabrício Carpinejar. 

Arte de Egon Schiele

Quando alguém confessa que está casado há 30 anos, ataco:

– Tarado!

Ele tenta se explicar, logo repito:

– Tarado!

Ele gagueja, e gesticulo com o dedo:

– Tarado!

Ficar com a mesma mulher todo dia é obra de maníaco sexual. Não tem o que acrescentar. É safadeza em demasia. Sério, sem brincadeira, o homem casado é um pervertido. Deveria ser preso por atentado ao pudor. Não poderia sair por aí espalhando o exemplo.

Há a crença equivocada de que o solteiro dispõe de um harém, que pode sair livremente e aproveitar sua sexualidade sem dar satisfação. Que nada. O solteiro não larga a primeira marcha – ao engatar a terceira e correr um pouquinho, já troca de caso e necessita conhecer o percurso inteiro de novo.

O casamento é a porta dos sentidos, a autêntica libertinagem, o elo perdido do Marquês de Sade.

Sabe mais sobre sexo quem transa com a mesma mulher durante décadas do que aquele que tem uma diferente a cada manhã. É como jogador de futebol, que atua muito melhor com a sequência de partidas.

Mulher não é diversidade, é permanência. Ela se solta ao longo da convivência, impõe seu ritmo lentamente, até formar um estilo para se vestir e outro para se despir.

Depende de tempo para expor suas fantasias. Afortunado é o que não se separa antes dos cinco anos.

Com a intimidade, sua companhia realiza acrobacias inacreditáveis, transforma as janelas em trapézios; os trapézios, em escadas de incêndio.

Uma mulher devota é capaz das maiores obscenidades. Porque o amor tira a culpa, o amor elimina o preconceito, o amor não sofre de nojo.

Uma mulher devota enlouquece o marido. Cria suspense na hora certa, desarma o ciúme no último minuto. Tem informações privilegiadas sobre a vítima: conhece seus pontos fracos, o lugar do arrepio atrás do ouvido, onde tocar para acelerar ou retardar o prazer, o que falar para enervar o silêncio.

Uma mulher devota é irresistível, rodará a casa por um afago, estará reaproveitando os suspiros do dia nos gemidos de noite.

Uma mulher devota desfruta de segurança no relacionamento para correr riscos no quarto.

Vá se acostumando com a ideia: sua esposa humilha qualquer profissional, pois entra na cama para ganhar, não joga amistoso, não faz cera, não tem interesse a não ser o próprio orgasmo.

Sua esposa que é pornográfica. Ela dedicará absoluta atenção na transa, a atenção cristalina que vem da carência. Nada passará em branco, nada será esquecido.

As insanidades indescritíveis são experimentadas no matrimônio. Os casados são bando de loucos, irresponsáveis.

O altar perdoa a cama.